Um holandês que voa pela água

Tenho como sonho um dia poder implementar uma iniciativa para preservar o patrimônio náutico brasileiro… por isso, já pensando em algum dia poder implementá-lo, além do Cadastro de Veleiros Clássicos, decidi pesquisar e escrever artigos sobre diversos assuntos relacionados à vela brasileira, entre eles, os veleiros desenvolvidos no Brasil… é sobre isso que irá encontrar informações no texto abaixo… caso possa colaborar com informações ou registros históricos, entre em contato. O que não podemos deixar acontecer é essa história se perder.

Max Gorissen – Velejador. Escritor.

A história dos veleiros Flying Dutchman no Brasil começa como o de muitas outras classes de veleiros “tropicalizados”.

Neste caso, o Sr. Ernesto Haag Fraça, viu nos números 119 e 120 da revista Yachting Brasileiro (mês de setembro e outubro de 1954), uma reportagem sobre um veleiro da classe “Flying Dutchman” e resolveu construí-lo.

No dia 13 de maio de 1956, após aproximadamente um ano de construção, lançou o veleiro na represa “Nova” em São Paulo, mais precisamente, no acampamento dos Engenheiros.

Na época relatou; “Estou bastante satisfeito com o barco pois é bastante veloz, muito bom de leme e dá grande sensação. A única coisa que não gostei foi o peso, que ficou o barco (aprox. 200 kg), algo superior ao mínimo permitido pela classe (160 kg). Mesmo assim, para um barco de 6,05 m de comprimento de roda-a-roda e 1,69 m de boca acho-o bastante leve. Fiz o casco em quatro camadas coladas, em cima de um molde, que depois de lixado ficou com aproximadamente 72 mm de espessura, ficando bastante resistente e um pouco flexível, o que acho vantajoso em mar picado. Com seus 17,5 m² de área velica (10 m² na vela grande e 7,5 m² na genoa), o barco anda muito bem à bolina, través, e com o “spinnaker” de 17 m², em popa. Não é um barco que orça tanto quanto um “Star”, um “5m R.I.”, ou um “Sharpie 12m²”, mas o que se perde em barlavento ganha-se em velocidade. No través é maravilhoso. Com vento 3 de Beaufort, ou mais, plana com muita facilidade desenvolvendo boa velocidade, tornando-se então emocionante. Em bolina e ao traves quando o vento refresca, usa-se o trapézio que além de sensacional é bastante cômodo e simples de ser usado. Acho uma pena as outras classes não permitirem o uso deste trapézio devido à sua eficiência, pois uma tripulação leve, e, portanto, suficiente com vento fraco, aguenta perfeitamente em vento forte, devido ao maior contrapeso a barlavento formado por esta mesma tripulação. É um casco planador de bonitas linhas, muito veloz tanto no vento fraco como forte e mar picado, e bastante estável graças ao trapézio. Espero que apareçam outros adeptos para esta classe, pois é um barco muito bom, de custo razoável e de organização internacional. Aqui em São Paulo existem várias pessoas interessadas e, no Rio Grande do Sul o sr. Léo Van den Berg (Porto Alegre), também está construindo um outro para um amigo”.1

O primeiro FD nacional de Sr. Ernesto Haag Fraça – Foto: Revista Yachting Brasileiro – agosto de 1956

O Flying Dutchman (FD) é um barco de regata monocasco de duas pessoas de alto desempenho de 20 pés. Desenvolvido no início da década de 1950 na Holanda, sua grande área velica por unidade de peso permite que ele planeie facilmente quando velejando no contra vento. O barco utiliza um trapézio para a tripulação e alças de escora para o timoneiro para escorar.

Fez sua estréia olímpica nos Jogos Olímpicos de 1960 (Roma – Itália) e foi uma classe Olímpica até os Jogos Olímpicos de 1992 (Barcelona – Espanha).

O FD ainda é um dos veleiros de regatas mais rápidos do mundo. Ele possui vela mestra, uma genoa muito grande e um spinnaker para o popa e través.

O FD tem sido a base para muitas inovações importantes na navegação durante o último meio século, como:

  • Primeiro one design a fazer uso de trapézio, um recurso comumente encontrado hoje em dinghies de alto desempenho e catamarãs;
  • Enrolador da genoa;
  • Traveler;
  • Calha para o Spinnaker;
  • Lançador de pau de Spinnaker.

Essas inovações foram possíveis porque o FD foi deixado como uma classe “aberta” de design único, onde a inovação e o desenvolvimento no barco são permitidos e encorajados. Os parâmetros que influenciam diretamente a velocidade do barco, incluindo a forma do casco, o peso e a área vélica, são estritamente controlados, mas outras áreas podem ser adaptadas para se adequar.

Desde 2008, a FD é uma das Classes de Barcos Vintage usados no Vintage Yachting Games.

No Brasil, alguns veleiros de madeira foram construídos nos anos 60, contudo, nenhum de fibra de vidro.

No ano de 1963, os velejadores do YCSA, Joaquim Roderbourg e seu poreiro Klaus Hendricksen, havia tempos quase imbatíveis na Classe FD na Represa de Gurapiranga (treinavam diariamente), conquistaram a medalha de ouro na classe Flying Dutchman nos Jogos Panamericanos de São Paulo.2

No veleiro FD Vento Sul (BL 22?), Roderbourg e o proeiro Hendricksen do YCSA comemoram a vitória na Classe Flying Dutchman no IV Jogos Panamericanos – Guarapiranga – SP – 1963 – Foto: YCSA

Em 1967, nos jogos Panamericanos de Winnipeg, no Canadá, Reinaldo Conrad decidiu mostrar sua habilidade na Classe Flying Dutchman formando par com Burkhard Cordes. Os dois se deram muito bem e conquistaram a medalha de prata, prenunciando uma glória ainda maior para o ano seguinte, na Olimpíada do México.

O Flying Dutchman, substituiu o veleiro Sharpie 12m² (leia Sharpie 12 m² – A história desses veleiros no Brasil), que ficara tecnicamente desatualizado, na categoria dinghy para duas pessoas na Olimpíada de Roma-Itália, no ano de 1960, sendo classe olímpica até o ano de 1992 (quando foi substituído pelo veleiro da Classe Star).

No livro “Livro: Soprando as Velas YCSA – 70 anos, Yacht Club Santo Amaro 1930 – 2000 – Ernesto Reibel “, fica o registro da história que levou os Paulistas ás Olimpíadas, reproduzido em parte a seguir:

“Em São Paulo, já estava em construção um barco com o qual Roderbourg ainda iria se dar muito bem: o Flying Dutchman, para dois tripulantes. Tudo começou em meados dos anos 50. O sócio do YCSA Peter Gottschalk foi procurado pelo amigo Ernesto França, que havia conhecido quando velejava na Represa Billings, no clube do Instituto de Engenharia de São Paulo. França era um estudante de engenharia da Universidade de São Paulo que adorava construir novos veleiros na garagem de sua casa. Naquela época, ele pediu a ajuda de Gottschalk, que trabalhava em uma empresa americana, para obter uma cola especial fabricada nos Estados Unidos para ser usada na construção de um casco de compensado moldado — algo inusitado naqueles tempos em que quase todas as embarcações eram de madeira maciça.

Gottschalk foi ver de perto o que França estava construindo e logo se encantou pelos conceitos revolucionários do Flying Dutchman. Tanto que não só arrumou a cola especial como também se tornou sócio no projeto. Passou a ajudar na fabricação e encomendou um barco para ele próprio. Tudo era diferente e ultra-moderno no FD. As ferragens, todas de aço inoxidável (pouco utilizado na época), foram feitas na fábrica onde Gottschalk trabalhava, sem que seus patrões soubessem. As velas ele importou dos Estados Unidos – eram de dacron, um material novo e desconhecido no Brasil.

Enquanto a construção prosseguia, Gottschalk contava as vantagens de seu barco para os sócios do YCSA.

Muitos ficavam curiosos e iam visitar a pequena oficina. Peter Mangels foi um deles e logo ficou entusiasmado em criar a classe na Guarapiranga, Ele vendeu a ideia para os principais velejadores do clube, como Joaquim Roderbourg e Klaus Hendriksen, que anos depois se tornariam quase imbatíveis no Flying Dutchman.

Contudo, a estreia foi desastrosa.

Depois de três anos, ficou pronto o BL-1 de França. Como ele e Gottschalk não conheciam bem as técnicas de fabricação, as tiras de compensado foram moldadas usando milhares de preguinhos e tachinhas, que depois de retirados deixaram milhares de pequenos furos no casco. Resultado: ao ser colocado na água, o primeiro Flying Dutchman da América Latina afundou sem cerimônias. Os dois construtores ainda conseguiram escapar da gozação, porque preventivamente lançaram o FD primogênito longe dos olhos dos sócios do YCSA, pois tinham receio que tudo desse errado.

Salvo do vexame, França não desistiu.

Fabricou um segundo Flying Dutchman para Gottschalk, o BL-2, que ficou pronto em um ano e de cara mostrou sua principal qualidade: era o veleiro mais veloz que qualquer um já havia visto na Guarapiranga. Assim nasceu a Classe FD no YCSA, que em poucos anos se tornaria uma das mais disputadas pelos sócios e traria muitos títulos nacionais e internacionais.

Vários barcos foram encomendados ao Estaleiro Guarapiranga, de Flório Zotarelli, a quem Ernesto França vendeu o molde, pois preferia continuar inventando outros veleiros.

Paulistas “VOADORES”

Na água, crescia o interesse pelos Flying Dutchmans. Já existiam vários desses barcos “voando” na Guarapiranga e os praticantes resolveram participar com eles da tradicional Regata da Escola Naval de 1958. Em mais uma pequena aventura, pela primeira vez os FD brasileiros saíram da represa para tomar parte em uma competição.

Os veleiros foram levados até o Rio de Janeiro em um avião cargueiro da Real, envoltos em colchões e acompanhados de perto pelos seus zelosos donos, que fizeram o desembarque pessoalmente no Aeroporto Santos Dumont, carregando os barcos nas costas. Eles montaram os FD na Escola Naval, na cabeceira do aeroporto, e seguiram navegando em flotilha até o late Clube do Rio de Janeiro (ICRJ), onde alguns renomados velejadores da época olhavam incrédulos as embarcações que só conheciam dos livros ou de ouvir falar.

À noite, quando o comitê organizador do ICRj se reuniu para cuidar dos últimos detalhes da regata, ficou decidido que, por ser mais veloz, a primeira classe a partir seria a Star.

Os integrantes da Flying Dutchman protestaram, mas ninguém acreditou, no dia seguinte, os Stars largaram na frente, mas na segunda perna da prova todos foram ultrapassados pelos Flying Dutchmans, que por muitos anos passaram a ser conhecidos como os veleiros de regata mais rápidos do Brasil.

Regata da Escola Naval de 1958Foto: Livro: Soprando as Velas YCSA – 70 anos, Yacht Club Santo Amaro 1930 – 2000 – Ernesto Reibel

Quem também quis provar da velocidade dos Flying Dutchmans foi o versátil Putz Richter, já em preparação para mais uma olimpíada. Ele encomendou o barco ao argentino Jorge Añel, que por falar tantas vezes a palavra “terrible” durante as etapas da construção, acabou batizando o veleiro. A bordo de seu “Terrible”, Putz fazia dupla com o proeiro Roberto Ferreira da Rosa.

Os dois passaram rapidamente a rivalizar com Joaquim Roderbourg e Klaus Hendriksen, que treinavam oito horas por dia e até então eram imbatíveis. Mas Putz comprou a briga e foi disputar contra eles uma vaga para correr na Olimpíada de Roma, em 1960. Não foi fácil, mas Putz tirou o doce da boca de Roderbourg e acabou indo com o “Terrible” para a sua terceira olimpíada.

Durante as Olimpíadas da Itália, Putz Richter e o proeiro Roberto Ferreira da Rosa estavam em Nápoles, correndo de Flying Dutchman, mas não tiveram a mesma sorte do pré-olímpico, quando conseguiram se classificar para os Jogos olímpicos em uma difícil disputa contra Joaquim Roderbourg e Klaus Hendriksen. Para começar, as velas novas que Putz havia encomendado ao melhor fabricante da Alemanha para correr em sua última olimpíada acabaram ficando para a equipe alemã. Ele foi para a água com as velas antigas, mas no terceiro dia de regata a bolina partiu-se ao meio e não havia outra para substituí-la. Assim o sonho da medalha olímpica havia acabado para Putz, mas para o YCSA essa era uma história que estava só começando.”3

O Brasil ganhou sua primeira medalha Olímpica de vela na classe Flying Dutchman com a dupla Reinaldo Conrad (timão) e Burkhard Cordes (proa), alcançando um bronze nos Jogos Olímpicos de 1968 (Cidade do México – entre 12 e 27 de outubro de 1968). 4

Reinaldo Conrad e Burkhard Cordes participando com seu FD BL 40, na Classe Flying Dutchman, nas Olimpíadas da Cidade do México no ano de 1968 – Foto: Autor não identificado. Se souber quem é o autor, favor entrar em contato para darmos a devida autoria.

Em Munique 1972, Reinaldo Conrad, ao lado de Burkhard Cordes, ficou com a quarta colocação na Classe Flying Dutchman.

Jogos Olímpicos 1972, Kiel Alemanha Reinaldo Conrad e Bukhard Cordes no FD. Fonte: “Soprando as velas” – YCSA

No ano de 1975, Reinaldo Conrad e Burkhard Cordes conquistaram a medalha de ouro em Vale Bravo, onde venceram a disputa da Classe Flying Dutchman nos Jogos Panamericanos do México.

Foto: Livro: Soprando as Velas YCSA – 70 anos, Yacht Club Santo Amaro 1930 – 2000 – Ernesto Reibel

Nas Olimpíadas de Montreal, no ano de 1976, Reinaldo Conrad repetiu o Bronze na Flying Dutchman com Peter Ficker na proa. Ao todo, Reinaldo Conrad participou de quatro edições dos Jogos Olímpicos na classe FD e, em 2008, uma na classe Star.

Reinaldo Conrad e Peter Ficker em duelo contra os Australianos nos Jogos de Montreal de 1976 – Foto: Acervo O Globo

Em Moscou, no ano 1980, Manfred Kaufmann Jr., campeão mundial da classe Lightning em Ilhabela – SP no ano de 1993 (veleiro Lightning BRA 12657 – Perereca – Manfred Kaufmann Jr., Renato Kaufmann e Marcelo Batista da Silva), velejou com Reinaldo Conrad, terminando na oitava posição na Flying Dutchman.

Fotos enviadas por Manfred Kaufmann do seu acervo particular. Direitos autorais reservados. Proibida sua reprodução.

Resultados Olímpicos Brasileiros na Classe Flying Dutchman.

O Flying Dutchman é provavelmente o único monotipo que tem bolina móvel, para frente e para trás. Isso, aliado a uma genoa gigante, trapézio e casco “limpo”, faz dele um barco de alto desempenho.

Artigo na revista Vela e Motor – Ano VII – No. 77 de agosto de 1983. Todos os direitos reservados. Proibida sua reprodução.

A última olimpíada dos FDs foi a de Barcelona, no ano de 1992. Após essa Olimpíada, a classe praticamente morreu no Brasil.

Mas não no mundo, onde os campeonatos mundiais, tanto na Europa como nos Estados Unidos, contam com mais de 100 barcos na raia.

Modelo: FD – Flying Dutchman
Período de produção no Brasil: 1956 (primeiro – artesanal)
Material construtivo: Madeira, fibra de Vidro e fibra de carbono
Armação: Sloop fracionado
Propulsão: Não possui
Tripulantes/ Passageiros: 1/ 1
Comprimento (LOA): 20 ft ou 6,06 m
Design No.: Ano 1951
Linha d’água (m): 5,5 m
Boca (m): 1,78 m
Calado (m): 1,12 m (com bolina) e 0,15 m (sem bolina)
Área velica (m²): 18,6 m² (mestra = 10,2 m² e genoa = 8,4 m²)
Grande: 10,2 m2
Genoa: 8,4 m2
Spinnaker: 21 m²
Peso do Casco: 130 Kg
Peso para velejar: 165 Kg
Projetista: Conrad Gulcher & Uus Van Essen – Holanda

Todas as posições de “ajustes” do FD – Desenho: Stockmaritime.com
Logo da Classe Flying Dutchman Internacional – IFDCO – International Flying Dutchman Class Organization
  • Associação da Classe Flying Dutchman do Brasil (associada á IFDCO) – 1960 – extinta.
  • International Flying Dutchman Class Organization – https://www.sailifdco.com/
  • International Flying Dutchman Class Association of the United States (IFDCAUS) – https://sailfdusa.org/
Logo da Classe Flying Dutchman
Nome originalAnoNumeralOutros nomes
Cadinavebelonaque
EitchaH 31 / BRA 2 
Fênix
Flying Dutchman BL 011956BL 01
Flying Dutchman BL 02BL 02
Flying Dutchman BL 08BL 08
Flying Dutchman BL 40BL 40
Flying Dutchman BL 45BL 45
Neptunus III1983BRA 53
Noroeste
Odin
Orixá I
Orixá II
Orixá IV
Polaris
Terrible
Thor
Ton Ton Macoute1963BL 32
Vento SulBL 22 ?

Detalhes do FD BL 45 – Nome? – Fotos: Max Gorissen

AnoNome do veleiroComandante
1995Neptunus IIIRoberto Martins Neto
1996Neptunus IIIRoberto Martins Neto
1997Orixá IVRoberto A.L. Montenegro
1998Orixá IFabio Calloni
2004Orixá IVRoberto A.L. Montenegro
2005Orixá IVRoberto A.L. Montenegro
2006Orixá IAlberto M. Lee
2007Neptunus IIIFrede Bojlesen
2008Orixá IIRoberto A.L. Montenegro
2009Orixá IIRoberto A.L. Montenegro
2010Orixá IVRoberto A.L. Montenegro
2011Neptunus IIIDick Treacher
2012Neptunus IIIDick Treacher
2013Neptunus IIIDick Treacher
2014Neptunus IIIDick Treacher
2015 Roberto A.L. Montenegro
2016  
Tabela com os campeões por ano fornecida por John Bennett – SPYC
O plano inicial para a mastreação do veleiro FD, era utilizar o mastro do Tornado; a designação ‘T’ do Tornado pode ser vista em fotos antigas do FD.
As normas da FD foram estabelecidas para garantir tolerâncias rigorosas no formato do casco e nas dimensões da mastreação, contudo, permitia também uma ampla variedade de layouts de convés e de acessórios. Por exemplo, o veleiro a direita, além de um convés mais largo e aberto, possui uma cana-de-leme bifurcada, uma substituição comum para a extensão do leme em veleiros europeus da época.

O “Flying Dutchman Junior” ou FJ, foi originalmente projetado na Holanda por Van Essen, renomado projetista de barcos holandês. Conrad Gulcher, velejador olímpico holandês, foi seu “co-projetista”. (Gulcher e Van Essen também colaboraram no Flying Dutchman. Conrad Gulcher atuou como Secretário de Classe Internacional para ambas as classes por muitos anos e foi um dos principais impulsionadores das classes International Flying Dutchman (FD) e International Flying Junior (FJ) até sua morte em 1989).
O primeiro FJ foi construído em madeira moldada a frio e foi testado na água em dezembro de 1955.

O propósito original do “Flying Dutchman Junior” era servir como um barco de treinamento júnior para o então novo Flying Dutchman (FD) olímpico. O FD é uma classe maior (6,06 m), mais rápida e com necessidade de mais condicionamento físico do que seu irmão mais novo. As regras do FJ também permitiam (e ainda permitem) muitas das mesmas inovações técnicas do FD, e o barco era (e ainda é) ideal para ensinar aos velejadores iniciantes as complexidades de regulagem, inclinação e curvatura do mastro, etc., tão importantes para a vela competitiva de alto nível.

O nome da classe foi rapidamente alterado para “Flying Junior” à medida que a classe se desenvolvia por conta própria, e a Flying Junior Class Organisation tornou-se livre e independente da organização Flying Dutchman por volta de 1960.

Especificações técnicas

Comprimento (LOA): 4,03 m
Boca (m): 1,50 m
Calado (m): 1,05 m (com bolina)
Área velica (m²): 9,7 m² (mestra = 7,3 m² e buja = 2,4 m²)
Spinnaker: 8,0 m²
Peso do Casco: 75 Kg
Peso para velejar: 165 Kg
Projetista: Conrad Gulcher & Van Essen – Holanda

Os Estaleiros Magnum do Brasil Ltda (fábrica em Avaré – SP), empresa nacional de construção de barcos, nos anos 1980, fabricava dois veleiros: o Magnum 422 e o Magnum 595 (depois abandonou a fabricação de veleiros e passou a fabricar somente a famosa lancha Magnum 30).

O veleiro Magmum 595 foi desenvolvido a partir de um casco de Flying Dutchman, do qual tiraram os moldes e idéias de mastreação, velame e ferragens. Construído somente em fibra de vidro, muitos 595s foram também construídos com uma pequena cabine de pé direito bem baixo (foto ao lado). Seu comprimento (LOA) é de 5,95 m (19,52 pés) e seu peso é de 286 Kg (contra 165 Kg do FD). Acomoda até 4 pessoas em navegação diurna e 2 pessoas em pernoite.

Arnaldo Andrade, das Velas Cognac, respondendo uma pergunta sobre o Magnum 595 em comparação com outros veleiros da mesma classe em um Fórum de vela nos anos 90 escreveu; “O casco é veloz, contudo, naturalmente, muito mais pesado do que o casco de um Flying Dutchman. Herdou do FD a vela grande com retranca comprida e baixa, e uma genoa. Com o passar dos anos, a genoa foi eliminada e substituída pela buja, de uso mais simples. Mas a vela mestra do FD foi mantida e é horrível. Esse é um aspecto no qual você terá que investir. Com cerca de 1.000 Reais você reduz o comprimento da retranca, põe-na a trabalhar mais alta do que na versão original do barco e manda fazer uma vela mestra moderna, conforme comentado em outro ponto do fórum. As adriças que içam as velas eram originalmente de aço. Se fossem trocadas por adriças de pré-esticado terão de ser novamente trocadas por Spectra – pelo menos a adriça da vela mestra. De resto, o material original, não sendo uma maravilha, dava conta do recado. Para descer e subir a serra rebocando com um carro 2.0 acho que o Magum já está no limite do peso. O Flash 165 talvez pese mais ou menos a mesma coisa. Os outros são mais pesados e vão lhe criar dificuldades.

Consegui identificar os seguintes veleiros Magnum 595: Pitchú, Bibó II, Taci, Curuminha, Tortuga (Sr.Sandro Ananias) e Marjo (Sr.Petrus Stel Tenpool), Cipoada (Sergio – Sergipe – foto acima), Iolanda (Washington – Sergipe).

Várias empresas construíram ao longo dos anos os veleiros da Classe FD.

No Brasil, por enquanto, encontrei registros de que foram construídos pelo Estaleiro Flório Zotarelli (Guarapiranga – SP) e pelo argentino Jorge Añel (veleiro Terrible de Putz Richter – 1959). Não consegui identificar nenhuma empresa brasileira produziu veleiros Flying Dutchman (além da Magnum, veja acima, que construíu com base neste) em fibra de vidro.

Os fabricantes internacionais que construíram/constróem são: Advance Sailboat Corp. (USA), Alpa Yachts (ITA), Binks Yacht Constructions, Costantini (Chantier Naval Costantini), Lanaverre (FRA), Lockley Newport Boats (USA), MacKay Boats Ltd., Mader Bootswerft, Mobjack Manufacturing Corp., Plastrend / Composite Technologies e Sunbeam Yachts – Schöchl Yachtbau. Muitas destas empresas já não existem mais, contudo, seus veleiros ainda navegam pelas águas de diversos países.

FD sendo montado pela Aeolos Composits – Foto: Aeolos Yachts. Todos os direitos reservados.

Bootswerft Leonhard Mader GmbH

Site: https://www.mader-boote.de/

FD construído pela Mader – Foto: Bootswerft Leonhard Mader GmbH. Todos os direitos reservados.
FD construído pela Plana Tech em fibra de carbono – Foto: Plana Tech/ Felci Yacht Design. Todos os direitos reservados.
“Falando sobre o Flying Dutchman” – Revista Yachting Brasileiro – agosto de 1956
Banner da Associação da Classe flying Dutchman do Brasil informando sobre o 1o. Campeonato da Classe FD na Represa da Guarapiranga – SP realizada em maio de 1960, vencida por Joaquim no timão e Klaus na proa no FD BL 8 (nome?)

Saiba mais sobre a saga para participar dos campeonatos Americano, Panamericano e da Olimpíada de Tokio na Classe FD na entrevista dada por Klaus Hendriksen para Rodolfo Lucena, Editor de Informática da Folha de S.Paulo: Klaus Hendriksen colecionou 334 troféus e medalhas na vela

De um filme produzido comercialmente sobre as Olimpíadas de Roma de 1960, mostrando as regatas das classes Finn, Star e Flying Dutchman. Da Coleção de Filmes George O’Day.
Olimpíadas de Tóquio 1964 – Medalha de Prata na Vela – Keith Musto e Tony Young

No clube SPYC hoje acredito que temos 6 FDs, 3 de madeira e 3 em fibra feitos pela Mader.

Encontrei o casco de madeira do Eitcha bastante castigado em uma garagem perto do Pico do Jaraguá. O dono estava tentando adaptar um motor de popa e queria o barco para pescar. Tinha trocado ele em um dívida de uma marina. Eu trouxe para o SPYC onde removi e fiz novamente algumas camadas da laminação a frio, técnica de construção em madeira do barco. No processo acabei descobrindo que se tratava de um barco que ficou no SPYC por mais de 30 anos (o Eitcha era de Alain Fresnot). Havia sido construído no Brasil por volta de 1960 e reformado no estaleiro do Flório. Tenho velejado, mas ainda ficaram alguns pontos da reforma por terminar. Como encontrar o material certo para a junta de vedação da bolina e rever fixação dos brandais. Na época, o numeral era um incógnita e, para participar de regatas, coloquei na vela o número BL 002″.

FD Neptunus III – BRA 53 – 1983 – Tripulação: Dick Treacher e Pedro Treacher – Foto: Acervo particular de Dick Treacher.

Olá, Max!
Algumas informações sobre o Neptunus III.
Fabricado no ano de 1983 pelo estaleiro Mader (GER).
Casco em fibra de kevlar e deck de madeira.
Barco foi importado por Sérgio Mirsky, grande velejador do ICRJ, já falecido. O filho do Sérgio Mirsky é o André Mirsky, outro “baita” velejador. Todos os barcos deles são batizados de NEPTUNUS.
Roberto Martins comprou do filho dele e depois trouxe para o SPYC.
Comprei do Roberto em 2009.
Frede Bojlesen não foi proprietário. Ele emprestou o barco.
Hoje o Neptunos III pertence ao meu filho, Pedro Treacher.
O numeral correto é BRA 53. A vela GBR 370 eu trouxe da Inglaterra e passei a utilizá-la.
Nos idos de 2009 a 2013 chegamos a ter uns 10 FDs no SPYC. Era bem legal e animado.
Os ”pegas” melhores eram entre o Roberto Montenegro, Alberto Lee e eu.
Vale a pena dar uma olhada nas súmulas das regatas daquela época.
Um detalhe dos FDs:
É provavelmente o único monotipo que tem bolina móvel, para frente e para trás. Isso, aliado a uma genoa gigante, trapézio e casco “limpo”, faz dele um barco de alta performance.
A última olimpíada dos FDs foi a Barcelona 92. Após essa Olimpíada, a classe praticamente morreu no Brasil. Mas não no mundo, onde os campeonatos mundiais, tanto na Europa como nos Estados Unidos, contam com mais de 100 barcos na raia.

FD Neptunus III durante a Regata de Abertura Guarapiranga de 2011 – Tripulação: Dick Treacher e Pedro Treacher – Fotos: Acervo particular de Dick Treacher.

FD Neptunus III no SPYC – Foto: Acervo particular de Dick Treacher.
  • Francisco Luiz Silva do SPYC (com edições da Revista Yachting Brasileiro)
  • Carlos Zink – FD Eitcha! – SPYC
  • John Bennett – O-Jolle – SPYC
  • Manfred Kaufmann Jr.
  • Richard Treacher

Espero que tenha gostado pois, cada embarcação clássica tem uma história única para contar e que pode servir de referência e consulta para historiadores, pessoas e instituições interessadas, antigos e novos proprietários e o público em geral, promovendo assim a rica e as intrigantes histórias associadas a esses clássicos e preservando e aumentando assim seu significado cultural para as gerações futuras.

Bons ventos!

Max Gorissen

Velejador. Escritor.


  1. “Falando sobre o Flying Dutchman” – Revista Yachting Brasileiro – agosto de 1956 ↩︎
  2. Livro: Soprando as Velas YCSA – 70 anos, Yacht Club Santo Amaro 1930 – 2000 – Ernesto Reibel (principal fonte de pesquisa, onde muitos trechos foram extraídos) ↩︎
  3. Livro: Soprando as Velas YCSA – 70 anos, Yacht Club Santo Amaro 1930 – 2000 – Ernesto Reibel (principal fonte de pesquisa, onde muitos trechos foram extraídos) ↩︎
  4. Conheça as origens das medalhas da vela brasileira em Jogos Olímpicos ↩︎

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